A trama territorial: Pertença, mobilidade e trabalho no Brasil contemporâneo

A trama territorial: Pertença, mobilidade e trabalho no Brasil contemporâneo

Este projecto visa explorar a relação entre trabalho (formal, informal; assalariado, doméstico; rural, urbano; tradicional, moderno; migratório, local; etc.) e a inscrição territorial em termos de mobilidade humana (pertença, propriedade, uso, herança, etc.). Seguindo os movimentos de pessoas através de uma pluralidade de contextos, pretendemos mostrar como o território é parte dos processos de constituição pessoal, criando o que chamamos "tramas territoriais". A nossa intenção é explorar como é que as mesmas pessoas recorrem a diferentes meios em sucessão e em alternância. O acesso à terra e o uso do território são aspectos centrais nas relações de trabalho das pessoas tanto nas cidades como nos campos.

No Brasil, a propriedade legal da terra é frequentemente ambígua e o suo do território onde vivem e trabalham inscreve-se frequentemente em complexas redes de relações sociais e de factores ambientais que garantem a sustentabilidade de uso. Estamos preocupados em compreender a integração entre tipos de uso legal e informal no referente ao acesso à terra e a recursos territoriais (tanto recursos naturais como o mangal, os sistemas aquíferos, os espaços de floresta, o uso de trilhos e acessos, etc.; como redes sociais, em geral ligadas ao crédito, ao favor e ao paternalismo). Para os fins deste projecto, concebemos o conceito de trabalho na sua acepção mais geral como uma categoria que inclui todas as actividades dirigidas a assegurar, directa ou indirectamente, o sustento da pessoa e da sua família. Na verdade, a pesquisa anterior sugere que a concepção que as pessoas têm da sua actividade de trabalho está em última instância relacionada como a noção de "potencialização da vida". Isto significa que o trabalho é um aspecto central da própria concepção do self. Mark Harris insiste que deveríamos ver "o trabalho como vida", que "O trabalho é um estilo de vida e uma base para a identidade." (2000: 142) Por conseguinte, o projecto pretende estudar a relação entre pessoalidade e trabalho como um processo complexo que abrange tanto a relação da pessoa com a família e os vizinhos como a inserção da pessoa em áreas de socialidade que, em última instancia, constituem uma "trama territorial". A liberdade pessoa é um factor na relação de cada um com o "favor" no âmbito das relações de poder com um empregador. A pluriactividade (quer dizer, o engajamento de cada um numa pluralidade de formas de trabalho) e, assim, concebida como a categoria dominante (default category) e não como um caso especial (cf. Schneider 2003). Este aspecto é particularmente relevante quando os ambientes rural e urbano interagem no interior do currículo de uma pessoa. Por isso até urge tratar as actividades domésticas como trabalho (cf. Melo et al 2007), adoptando uma concepção da divisão sexual do trabalho que enfatize tanto a complexidade como a complementaridade. DE facto, prevemos desde já que nos confrontaremos com situações onde, por um lado, as mulheres jovens se envolvem regularmente com trabalho assalariado urbano e, por outro lado, os homens estão sujeitos a desemprego recorrente (cf. Antunes e Alves 2004). O contraste entre subsistência e consumo, que tantas vezes surge como bipolar, pode ser altamente enganador, impedindo nos de compreender a forma pela qual a globalização entrou nas esferas mais privadas e isoladas da vida doméstica. O consumo e a subsistência só dificilmente podem ser desentrançadas. O projecto irá desenvolver-se em diferentes contextos regionais no Brasil, através de uma estratégia comparativa que permita quebrar as compartimentações sociológicas tradicionais, tais como rural/urbano, local/migratório, indígena/regional, etc.

Não visamos a representatividade mas sim o aprofundamento de um naipe de questões teóricas. A nossa abordagem será etnográfica e qualitativa, baseada em observação participante e pesquisa de arquivo. A escolha dos casos a estudar resulta de investigação anteriormente empreendida no sentido de maximizar a nossa compreensão teórica da relação entre trabalho e mobilidade territorial. Apesar do enfoque ser sobre populações de baixa renda, o projecto não se concebe como estudando contexto urbanos ou rurais, nacionais ou internacionais. O projecto será dividido em duas linhas de investigação que abrangem sub-projectos. A linha "Recursos e Vida" integrará: (i) "Trabalho, território e género no mangal do Baixo Sul (Bahia)", (ii) "Territorialidades, Mediações e Redes na Amazónia Oriental (Maranhão)" e (iii) "Mulheres na mobilidade transnacional entre Goiás e Portugal". A linha "Terra e Modos de relação" integrará: (i) "Uma abordagem comparativa da reivindicação de terras (Tupinambá de Olivença)", (ii) "Ambiente, sazonalidade e parentesco no estuário do Amazonas (Afuá)", (iii) "Mobilidade, território e família no Nordeste brasileiro".

 

Estatuto: 
Entidade proponente
Financiado: 
Não
Entidades: 
Fundação para a Ciência e Tecnologia
Rede: 
A trama territorial
Keywords: 

Território; Trabalho; Mobilidade; Brasil

Este projecto visa explorar a relação entre trabalho (formal, informal; assalariado, doméstico; rural, urbano; tradicional, moderno; migratório, local; etc.) e a inscrição territorial em termos de mobilidade humana (pertença, propriedade, uso, herança, etc.). Seguindo os movimentos de pessoas através de uma pluralidade de contextos, pretendemos mostrar como o território é parte dos processos de constituição pessoal, criando o que chamamos "tramas territoriais". A nossa intenção é explorar como é que as mesmas pessoas recorrem a diferentes meios em sucessão e em alternância. O acesso à terra e o uso do território são aspectos centrais nas relações de trabalho das pessoas tanto nas cidades como nos campos.

No Brasil, a propriedade legal da terra é frequentemente ambígua e o suo do território onde vivem e trabalham inscreve-se frequentemente em complexas redes de relações sociais e de factores ambientais que garantem a sustentabilidade de uso. Estamos preocupados em compreender a integração entre tipos de uso legal e informal no referente ao acesso à terra e a recursos territoriais (tanto recursos naturais como o mangal, os sistemas aquíferos, os espaços de floresta, o uso de trilhos e acessos, etc.; como redes sociais, em geral ligadas ao crédito, ao favor e ao paternalismo). Para os fins deste projecto, concebemos o conceito de trabalho na sua acepção mais geral como uma categoria que inclui todas as actividades dirigidas a assegurar, directa ou indirectamente, o sustento da pessoa e da sua família. Na verdade, a pesquisa anterior sugere que a concepção que as pessoas têm da sua actividade de trabalho está em última instância relacionada como a noção de "potencialização da vida". Isto significa que o trabalho é um aspecto central da própria concepção do self. Mark Harris insiste que deveríamos ver "o trabalho como vida", que "O trabalho é um estilo de vida e uma base para a identidade." (2000: 142) Por conseguinte, o projecto pretende estudar a relação entre pessoalidade e trabalho como um processo complexo que abrange tanto a relação da pessoa com a família e os vizinhos como a inserção da pessoa em áreas de socialidade que, em última instancia, constituem uma "trama territorial". A liberdade pessoa é um factor na relação de cada um com o "favor" no âmbito das relações de poder com um empregador. A pluriactividade (quer dizer, o engajamento de cada um numa pluralidade de formas de trabalho) e, assim, concebida como a categoria dominante (default category) e não como um caso especial (cf. Schneider 2003). Este aspecto é particularmente relevante quando os ambientes rural e urbano interagem no interior do currículo de uma pessoa. Por isso até urge tratar as actividades domésticas como trabalho (cf. Melo et al 2007), adoptando uma concepção da divisão sexual do trabalho que enfatize tanto a complexidade como a complementaridade. DE facto, prevemos desde já que nos confrontaremos com situações onde, por um lado, as mulheres jovens se envolvem regularmente com trabalho assalariado urbano e, por outro lado, os homens estão sujeitos a desemprego recorrente (cf. Antunes e Alves 2004). O contraste entre subsistência e consumo, que tantas vezes surge como bipolar, pode ser altamente enganador, impedindo nos de compreender a forma pela qual a globalização entrou nas esferas mais privadas e isoladas da vida doméstica. O consumo e a subsistência só dificilmente podem ser desentrançadas. O projecto irá desenvolver-se em diferentes contextos regionais no Brasil, através de uma estratégia comparativa que permita quebrar as compartimentações sociológicas tradicionais, tais como rural/urbano, local/migratório, indígena/regional, etc.

Não visamos a representatividade mas sim o aprofundamento de um naipe de questões teóricas. A nossa abordagem será etnográfica e qualitativa, baseada em observação participante e pesquisa de arquivo. A escolha dos casos a estudar resulta de investigação anteriormente empreendida no sentido de maximizar a nossa compreensão teórica da relação entre trabalho e mobilidade territorial. Apesar do enfoque ser sobre populações de baixa renda, o projecto não se concebe como estudando contexto urbanos ou rurais, nacionais ou internacionais. O projecto será dividido em duas linhas de investigação que abrangem sub-projectos. A linha "Recursos e Vida" integrará: (i) "Trabalho, território e género no mangal do Baixo Sul (Bahia)", (ii) "Territorialidades, Mediações e Redes na Amazónia Oriental (Maranhão)" e (iii) "Mulheres na mobilidade transnacional entre Goiás e Portugal". A linha "Terra e Modos de relação" integrará: (i) "Uma abordagem comparativa da reivindicação de terras (Tupinambá de Olivença)", (ii) "Ambiente, sazonalidade e parentesco no estuário do Amazonas (Afuá)", (iii) "Mobilidade, território e família no Nordeste brasileiro".

 

Objectivos: 
The project will focus on different regional settings in Brazil, with the purpose of providing a comparative outlook, thus breaking through the categories that have traditionally compartimentalized social scientific research, such as rural/urban, local/migrant, indigenous/regional, etc. We do not aim at representativeness but rather at a deepening of the theoretical concerns. The approach will be ethnographic and qualitative, based on prolonged personal observation and archival research. We have chosen the different settings taking into consideration previous research experience so as to maximize the possibility of deepening our theoretical understanding of the relation between work and territorial mobility. Whilst focusing on populations with low income, the project does not see itself as studying either urban or rural, either national or international contexts.
State of the art: 
Our project results from the bringing together of a set of already consolidated research experiences concerning personhood and territorial relations. In particular, work by Susana de Matos Viegas among the Tupinambá of Olivença on kinship, gender and territory (Bahia - Viegas 2003, 2005, 2007, 2008); by Pina-Cabral on personhood and naming in Bahia (Pina-Cabral 2005, 2007, 2008 and Pina-Cabral and Viegas 2007); by Emilia Pietrafesa de Godoi in Piauí on rural relations and gender (Godoi e Nymeyer 1998; Godoi 1999, 2001); and, finally, by Vanda Aparecida da Silva on rural life and youth in the lower valley of the Jequitinhonha (MG, Brazil - 2008). Attitudes to work "are becoming an increasingly relevant topic of research in terms of the human mobility that the present global crisis is bringing to the fore" (Antunes e Alves 2004, Hirata e Kergoat 2007). Brazilian sociologists have argued that, "When we examine the reality of today's work situations we must recognize that we are facing transformations that require a revision of concepts, a constitution of new alternatives and considerable sociological imagination. It seems difficult to formulate alternatives on the basis of past models."; (Larangeira 2004: 16) We aim to relate work with territorial mobility and access to resources as previous research experience suggested that a multidimensional approach must be adopted. On the one hand, one must take into consideration how natural resources relate to social networks based on kinship, work and local belonging (M. Harris 2000; Olivia Harris 2000); on the other hand, one must overcome the dichotomization implicit in categories such as urban/rural, indigenous/mixed blood, land as politics/land as living (S. Nugent and M. Harris 2004). The relation between household and work has a long tradition in Brazilian rural studies and needs to be reconsidered in the light of new developments (e.g. Palmeira 1977). From the point of view of land as lived experience, in which emotions and politics interfere upon each other, anthropological approaches to territorial belonging based on concepts such as "landscape" (Hirsh and O'Hanlon 1995) appear to have limited explanatory value: "the defining aspect of landscape is the distanciation of the viewer from the object viewed" (Leach 2004: 196). One should revise notions of kinship and person by giving a priority to "what kinds of relations people have with, or to, the land itself" (Leach 2004: 29). In this light, Comerford's work on mapping, familiarization and reputation provides an interesting entry into the question (2003). The relationship between ownership, relatedness and the lived experience of place (including economic and sociocultural dimensions) will also studied in terms of how property is legally constructed and informally used. We follow here a suggestion already present in one of the classical monographs of our discipline: "A group of Bemba walking from place to place through their tribal territory view surroundings from an entirely different standpoint from our own. (...) This general attitude of the people towards their environment is important to describe. It expresses the line of their economic interests, and ultimately determines the legal rules by which their land is used."; (Richards 1969 [1939]: 230). The centrality of the relation between mobility and work has been stressed: "mobility becomes important for its meaning in the life history of the people (...) because it is part of their shared understanding of the person, its states of mind and existential conditions."; (Pissolato 2007: 123) Individual biographies are granting increasing importance to a panoply of different types of mobility: regional, national within Brazil and international (cf. Gardner 1995; Ong 1999).
Parceria: 
Rede Internacional
Ana Luisa Micaelo
Emilia Pietrafesa de Godoy
Coordenador 
Data Inicio: 
01/02/2010
Data Fim: 
01/02/2013
Duração: 
36 meses
Concluído