Como reconstituir situações vividas e partilhadas ao mesmo tempo por investigadores, jornalistas, políticos e, naturalmente, habitantes? Como deixar a palavra ao conjunto destas vozes e pontos de vista sobre uma mesma realidade, que se misturam e se influenciam mutuamente? Esta peça de teatro em três actos, acompanhada de uma análise dos discursos e de um balanço crítico, reconstrói a história recente da construção de uma barragem e da deslocação de uma aldeia e dos seus habitantes para outras lógicas de ocupação dos espaços e de exploração do ambiente. A abordagem antropológica, levada a cabo in situ ao longo de quinze anos, oferece aqui um olhar multifacetado sobre as diferentes formas de apreender uma situação, que acaba por ser bastante banal a nível mundial, mas em cada caso repleta de dúvidas, de expectativas e de emoções. Esta forma de escrita polifónica sugere uma familiaridade que, ainda que distante, desperta em nós sentimentos comuns, da raiva à empatia. Maior albufeira da Europa, ao mesmo tempo herdeira das velhas tradições civilizadoras de desenvolvimento estatal através da água, precursora no domínio da aplicação de medidas de concertação, e uma das mais modernas construções de uma reserva de água controlada, a grande barragem de Alqueva em Portugal, segundo a autora, é e será, muito provavelmente, o último empreendimento desta envergadura.