ICS Policy brief 2020 - Obsservatório da Qualidade da Democracia
9 8 Como é possível constatar através da Figura 3, o governo actual encontra-se entre os três executivos com níveis habili- tacionais mais elevados. Em termos de credenciais académi- cas, à frente do actual governo, só mesmo o anterior execu- tivo de António Costa e o primeiro governo de José Sócrates. Os dados apresentados no gráfico corroboram – e num certo sentido até acentuam – um dos traços que anteriores estudos sobre o perfil da elite governativa tinham apontado: a impor- tância das habilitações académicas como pré-requisito para o exercício do cargo ministerial (Almeida e Pinto, 2006). Outro traço fundamental que tem caracterizado elite polí- tica portuguesa é escassa presença de mulheres na esfera parlamentar e governativa. Se excluirmos o caso atípico do IV governo constitucional – um governo de iniciativa presi- dencial liderado por Maria de Lurdes Pintasilgo – é necessá- rio esperar até 1985 para encontrar uma mulher elevada à condição de ministro. Ao nomear Leonor Beleza para a pasta da saúde no seu primeiro executivo, Cavaco Silva iniciou um tímido processo de recrutamento ministerial feminino. Até então, e ainda que de forma bastante limitada, a presença de mulheres no governo tinha-se manifestado apenas ao nível dos secretários de Estado. De qualquer modo, ao longo dos anos, como a Figura 4 demonstra, o recrutamento de mulhe- res para postos ministeriais tem aumentado. Não deixa de ser interessante verificar que, olhando para os governos inaugu- rais, esse aumento seja maior em governos liderados pelo PS. Ao nomear 8 mulheres para um cargo ministerial – tornando- -se assim o executivo com maior representação feminina em democracia –, o actual governo constitui um exemplo para- digmático desta tendência. Figura 4: Ministras mulheres (percentagens) Em relação à idade, os primeiros governos constitucionais apresentam uma média de idade mais baixa. Trata-se de um dado expectável, uma vez que corresponde a uma decorrência da juventude do próprio regime democrático. O novo milé- nio – mais concretamente o governo liderado por Durão Bar- roso – marca um ponto de viragem no sentido da formação de governos com uma média de idades superior a 50 anos. O actual governo insere-se nesta tendência. Ainda assim, com uma média de 52.7 anos, apresenta um elenco ministerial ligeiramente mais novo que o primeiro governo de António Costa (54 anos) ou que os governos socialistas liderados por José Sócrates (53.5 e 54.6 respectivamente). Uma das dimensões mais analisadas e debatidas sobre a elite governativa em Portugal refere-se à ligação dos minis- tros aos partidos, salientando-se a presença significativa de ministros sem filiação partidária ou com escassa experiên- cia política nos vários executivos (Lobo, 2000; 2005; Almeida e Pinto, 2009). O peso e importância de ministros sem car- reira parlamentar ou cargos de direcção partidária tem sido muitas vezes apresentado com uma divergência nacional face aos padrões predominantes na maioria das democracias euro- peias (Pinto, 2020). Indo além da tradicional visão dicotómica entre ministros partidários e independentes, a Figura 5 per- mite-nos identificar diferentes dinâmicas existentes nos dois campos. Figura 5: Vínculo partidário dos ministros (percentagens) A primeira conclusão que podemos retirar é que o número de independentes é de facto bastante elevado e tende a ser maior nos governos liderados pelo PS. Com cerca de meta- de de ministros apartidários, os governos liderados por José Sócrates constituíram a expressão esdrúxula do recrutamen- to de independentes. No entanto, podemos ainda verificar que o número de “independentes puros” não é tão grande como se poderia pensar. O número de semi-independentes represen- ta uma fatia bastante significativa. Estes são ministros sem filiação partidária que gravitam na órbita de um determinado partido. Sendo próximos politicamente e tendo ligações infor- mais à esfera partidária – na maioria dos casos com uma tra- jectória de colaboração política e governativa com um deter- minado partido–, estes independentes têm constituído uma reserva de recrutamento importante para os principais par- tidos governativos. No universo dos ministros com filiação partidária, a figu- ra distingue entre os ministros que, à data da nomeação, se encontravam na simples condição de militantes e aqueles que ocupavam cargos de direcção nos órgãos nacionais do parti- do. Como seria expectável, os dados demonstram que todos os governos tendem a recrutar para cargos ministeriais uma fatia importante de dirigentes nacionais. Não se trata, porém, de uma condição necessária ou imprescindível para chegar a ministro. A composição do governo actual resulta de uma combinação de semi-independentes com dirigentes nacionais. É um governo que também neste domínio se assemelha mui- to a anteriores governos socialistas, sobretudo ao segundo governo de António Guterres (Camerlo, Paris, Silvera 2019). Os secretários de Estado constituem o terceiro dos quatro escalões do governo português (após o Primeiro-ministro e os ministros e antes dos subsecretários de Estado). Exercem funções generalistas e detêm uma pasta própria o que lhes confere uma importância significativa numa subárea especí- fica do ministério, em que são, na prática, os representantes do governo e onde possuem uma autonomia considerável. No entanto, fazem-no sob a dependência de um ministro que, através de um despacho de delegação, estipula as suas com- petências. Assim, os secretários de Estado são responsáveis perante o ministro e cessam funções quando aqueles deixam o executivo (art. 186-3º e 191-3º, CRP). Ao assumirem funções concretas de coordenação políti- ca, alguns secretários de Estado adquirem peso acrescido no governo. Entre estes, assumem especial importância o secre- tário de Estado adjunto do primeiro-ministro, o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, e o secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros. Significativamen- te, este último toma posse no mesmo dia dos ministros e participa nas reuniões do Conselho de Ministros. Em média, desde 1976 até 2020, os governos portugueses incluíram 37 secretários de Estado no seu elenco inicial. Na verdade, a variação entre governos é relativamente baixa, mantendo-se usualmente entre os 30 e os 40. Apenas em 1978 e 1979, durante dois governos de iniciativa presidencial (o III e o V Governo Constitucional), o mandato governativo foi ini- ciado com menos de 30 secretários de Estado. No extremo oposto, o executivo mais extenso foi o segundo governo de António Costa, com 50. Os subsecretários de Estado são pouco utilizados em Por- tugal, sendo nomeados quando as pastas detêm especial com- plexidade e/ou existam políticas específicas que mereçam ser incumbidas a este membro do governo. O XII Governo contou com 8 subsecretários de Estado mas esta constituiu uma situa- ção excepcional. Como se demonstra na Figura 6, a maior par- te dos governos não nomeou nenhum, nomeou muito poucos ou fê-lo durante o mandato para responder a exigências espe- cíficas e imprevistas. SECRETÁRIOS E SUBSECRETÁRIOS DE ESTADO Figura 6: Secretários e subsecretários de Estado (frequências) Figura 7: Mulheres secretárias de Estado (percentagens)
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy MTY4OTk1