ICS Policy brief 2020 - Obsservatório da Qualidade da Democracia

5 4 motivaram debate no espaço público. A título ilustrativo, criticou-se o facto de ser o maior governo desde 1976 e, em contrapartida, elogiou-se o número de mulheres com assen- to no Conselho de Ministros. Ao mesmo tempo, discutiu-se o reforço do peso político do governo (devido ao aumento do número de ministros pertencentes ao Secretariado do PS) e a importância hierárquica dos ministros (com base no núme- ro e na ordenação dos quatro ministros de Estado). Algumas destas dimensões constituem o ponto de partida para a for- mulação, nas próximas secções, de um olhar retrospectivo sobre a evolução das principais características dos governos e das elites governativas desde 1976. Simultaneamente, esse olhar retrospectivo, servirá como ponto de comparação para analisar e avaliar os atributos do actual governo. no processo de constituição e viabilização parlamentar do XXI governo constitucional. Nunca até então uma maioria de esquerda no parlamento tinha produzido uma solução de apoio a um governo liderado pelo PS. Contudo, a novidade aqui introduzida limitou-se ao apoio parlamentar ao gover- no, não tendo tido qualquer tradução em termos de compo- sição partidária do executivo. O actual executivo – o 22.º governo constitucional – iniciou o seu mandato com 19 ministros e 50 secretários de Estado. Com uma média de idades de 53 anos à data da tomada de pos- se, 68% dos 19 ministros possuíam habilitações académicas de nível pós-graduado (quase todos com doutoramento) e 42% (8) eram mulheres. Se 47% dos ministros podia ser formalmente considerada independente, cerca de 90% dos ministros sem filiação partidária correspondia àquilo a que temos vindo a chamar semi-independentes ( soft partisans ), ou seja, ministros formalmente apartidários, mas com uma trajectória de colab- oração política com um determinado partido. De resto, em contraste com o governo cessante, o actual executivo liderado por António Costa conta com 4 ministro de Estado. Algumas destas características suscitaram interesse e do chamado “arco da governação” (PS, PSD e CDS). Para além destes – mas apenas durante um breve período, que coin- cidiu com os governos da AD – um pequeno partido (PPM) integrou o executivo. Com efeito, em quarenta anos, um dos traços mais salientes do sistema partidário português foi a exclusão de uma parte da esquerda partidária (PCP e BE) da esfera governativa. Este traço só parcialmente foi removido PM Posse Tipo Composição Término Vic-Min-Sec-Ssec Mário Soares I Jul-76 MonMin PS Rejeição de Moção de Confiança - 17 39 6 Mário Soares II Jan-78 ColMai PS+CDS Exoneração do PM pelo PR - 15 30 2 Nobre da Costa Aug-78 Presi apartidário Rejeição programa - 14 29 2 Mota Pinto Nov-78 Presi apartidário Renúncia do PM 1 15 31 3 Lurdes Pintasilgo Jul-79 Presi apartidário Dissolução da AR - 16 27 2 Sá Carneiro Jan-80 ColMai PSD+CDS+PPM Morte do PM 1 14 38 1 Pinto Balsemão I Jan-81 ColMai PSD+CDS+PPM Renúncia do PM - 17 39 1 Pinto Balsemão II Sep-81 ColMai PSD+CDS+PPM Renúncia do PM e dis- solução da AR 1 14 43 3 Mário Soares III Jun-83 ColMai PS+PSD Dissolução da AR 1 16 38 1 Cavaco Silva I Nov-85 MonMin PSD Moção de Censura - 13 32 0 Cavaco Silva II Aug-87 MonMai PSD Final do mandato 1 15 36 0 Cavaco Silva III Oct-91 MonMai PSD Final do mandato - 16 42 8 António Guterres I Oct-95 MonMin PS Final do mandato - 17 39 0 António Guterres II Oct-99 MonMin PS Renúncia do PM e dis- solução da AR - 17 42 0 Durão Barroso Apr-02 ColMai PSD+CDS Renúncia do PM - 17 34 0 Santana Lopes Jul-04 ColMai PSD+CDS Dissolução da AR - 19 38 0 José Sócrates I Mar-05 MonMai PS Final do mandato - 16 35 1 José Sócrates II Oct-09 MonMin PS Renúncia do PM e dis- solução da AR - 16 38 0 Passos Coelho I Jun-11 ColMai PSD+CDS Final do mandato ** 11 34 1 Passos Coelho II Oct-15 ColMin PSD+CDS Rejeição programa 1 16 36 0 António Costa I Nov-15 MonMin PS Final do mandato - 17 41 0 António Costa II Oct-19 MonMin PS A decorrer - 19 50 0 GOVERNOS 1976-2020 Desde a entrada em vigor da Constituição, a 2 de abril de 1976, Portugal assistiu à tomada de posse de 22 governos cons- titucionais. A primeira década da democracia foi um perío- do marcado por uma grande instabilidade governativa. De facto, até 1987 – data da primeira maioria absoluta mono- partidária – nenhum governo conseguiu cumprir integral- mente uma legislatura. Apesar das várias fórmulas ensaiadas – governo minoritário de um só partido, governos de coliga- ção com apoio maioritário no parlamento e governos de ini- ciativa presidencial – nenhum executivo conseguiu produzir uma solução política estável e coesa que lhe permitisse cum- prir integralmente o mandato. Só em 1991, depois de uma sólida maioria parlamentar alcançada em 1987, o II governo do PSD liderado por Cavaco Silva conseguiu chegar ao termo da legislatura. De qualquer modo, e ainda que o ano de 1987 marque uma viragem importante no sentido da estabilidade governativa, até hoje, apenas 6 governos não viram o seu mandato inter- rompido no decorrer da legislatura. São eles os dois governos maioritários de Cavaco Silva, o primeiro governo (minoritá- rio) de António Guterres, o governo maioritário de José Sócra- tes, o governo de coligação PSD/CDS liderado por Passos Coe- lho durante os anos da troika e, mais recentemente, o governo minoritário de António Costa, com o apoio parlamentar dos partidos à sua esquerda, BE, PCP e PEV. Desde 1976, todos os outros governos, embora por diferentes razões, caíram antes do tempo. As causas que conduziram à queda dos executivos resultaram da intervenção presidencial (através da demissão do Primeiro-Ministro ou da dissolução da Assembleia da Repú- blica), do parlamento (neste caso por intermédio da rejeição de moção de confiança, da rejeição do programa de governo ou da aprovação de uma moção de censura ao executivo pela oposição) ou, como sucedido várias vezes ao longo dos últimos 45 anos, pela resignação do Primeiro-Ministro. De Mota Pinto a José Sócrates, passando por Pinto Balsemão, António Guter- res ou Durão Barroso, vários chefes de governo apresentaram a demissão ao Presidente da República arrastando consigo a queda do governo. Verificamos que apenas os executivos maioritários de um só partido aparentam ter uma esperança média de vida coin- cidente com os quatro anos da legislatura. Sendo uma con- dição suficiente para a estabilidade governativa, uma maio- ria monopartidária não deve ser encarada, porém, como uma condição necessária. De facto, desde 1987, já dois governos minoritários de um só partido (ambos do PS) conseguiram sobreviver à legislatura e, entre 2011 e 2015, pela primeira vez, um governo de coligação conseguiu cumprir integral- mente o mandato. A composição partidária do governo surge como o tra- ço mais recorrente quando olhamos para os diferentes exe- cutivos nacionais. Com a breve excepção dos três governos de iniciativa presidencial, desde 1976, os governos têm sido chefiados alternadamente por PS e PSD, e os elencos gover- nativos compostos por indivíduos extraídos dos três partidos Tabela 1: Governos inaugurais (1976-2020) * Duração em meses. ** Nomeado a meio mandato. Presi: Iniciativa Presidencial ColMai: Coligação maioritário ColMin: Coligação minoritário MonMai: Monopartidário maioritário MonMin: Monopartidário minoritário

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