O QUE PENSAM OS PORTUGUESES SOBRE CORRUPÇÃO: PERCEPÇÕES – ATITUDES – PRÁTICAS

O QUE PENSAM OS PORTUGUESES SOBRE CORRUPÇÃO: PERCEPÇÕES – ATITUDES – PRÁTICAS

 

Estudo de opinião desenvolvido no âmbito do projecto EPOCA: corrupção e crise económica, financiado pela Fundação para Ciência e Tecnologia (FCT)

Coordenado por Luís de Sousa e Pedro Magalhães (ICS-ULisboa)

Análise de dados: Felippe Clemente, ICS-ULisboa

E-mail: epoca@ics.ulisboa.pt

RELATÓRIO 

(da INTRODUÇÃO)

Existe um debate crescente sobre o perigo de perda de apoio à democracia em vários países. Esta tendência e particularmente sensível em países que estiveram sob resgate financeiro e onde o desempenho das instituições basilares da democracia e do estado de direito têm estado aquém das expectativas e dos padrões internacionais referência, bem como as reformas de melhoria da qualidade da democracia ou tardam ou são implementadas de forma inconsistente, com resultados inócuos ou até contraproducentes.

O apoio a democracia manifesta-se por três vias: em termos da ideia de democracia e dos valores subjacentes a sua governação (difuso); do desempenho da sua estrutura institucional (específico); e das decisões e acções dos titulares do poder (racional). Embora haja uma vasta literatura sobre preditores económicos (focados nos resultados) e institucionais (focados nos processos) de apoio à democracia, pouco se disse sobre a sua interação.

O projecto EPOCA – Corrupção e crise económica, uma combinação perigosa: compreender as interacções processo-resultado na explicação democracia surge, deste modo, como uma tentativa de procurar compreender de que forma e em que medida os contextos de crise económica influenciam as percepções dos cidadãos tornam-se particularmente sensíveis a questão da corrupção, especialmente aquela que afecta os atores, instituições e processos políticos.

O objetivo geral deste estudo e o de analisar, a partir de dados correlacionais e experimentais, e de uma abordagem de métodos mistos, em que medida os contextos de crise, podem afetar as noções de justiça processual e os padrões éticos dos cidadãos, em particular os que regulam a sua relação com a política e como e que estes processos, por sua vez, ajudam a explicar os níveis e gradações de apoio à democracia. Neste sentido, desenvolveu-se de forma faseada e estruturada um inquérito à população, tendo em vista três objectivos específicos:

ƒ Consolidação - consolidar o conhecimento sobre as atitudes, percpeções e experiências de corrupc a o dos cidadãos em democracia, replicando algumas das questões centrais do primeiro grande inquérito a população intitulado Corrupção e Ética em Democracia: o caso de Portugal financiado pela FCT em 2006 [POCI / CPO / 60031/2004] e avaliar tendências antes e depois da crise.

ƒ Inovação - avançar o conhecimento teórico neste campo e em termos da medição de percpeções processuais e apoio político.

ƒ Validação - oferecer um campo experimental para testar metodologias e técnicas de recolha de dados. O projeto utilizara novos métodos experimentais para superar alguns dos problemas que são recorrentes no uso de inquéritos à população com enfoque em questões de cariz normativo. A Figura 1 sintetiza as principais etapas estratégicas adoptadas pela equipa de investigação para responder aos objetivos propostos.

(aqui: Figura 1 sintetiza as principais etapas estratégicas adoptadas pela equipa de investigação para responder aos objetivos propostos.)

Trata-se de uma abordagem inovadora sobre a corrupção e suas implicações para a qualidade da democracia, assente num inquérito à população e num estudo experimental e da partilha de resultados com stakeholders e cidadãos em geral. Através da combinação de excelência na investigação e advocacia social, o projeto visa contribuir para um debate mais informado sobre a dimensão subjectiva do fenómeno da corrupção e da sua resiliência em democracia.

Atendendo à pergunta de investigação e aos objectivos do projecto, o inquérito encontra-se organizado em quatro partes: (1) uma primeira parte, dedicada ao impacto percepcionado da crise no bem-estar das pessoas, bem como, às clássicas perguntas sobre o grau de satisfação com a democracia e confiança política, liderança e valores democráticos; (2) uma segunda parte, mais extensa, centrada nas percepções, atitudes e práticas face à corrupção e ao seu controlo; (3) uma terceira parte, que inclui uma experiência conjoint que visa compreender as preferências dos eleitores portugueses face a um conjunto de possíveis medidas de (auto)regulação da ética política, hipoteticamente propostas por dois partidos fictícios; (4) e por fim, uma bateria de indicadores de caracterização dos inquiridos.

Nesta publicação, procuramos centrar-nos apenas nas questões referentes à segunda parte do inquérito, procurando retratar de forma descritiva e parcimoniosa as percepções, atitudes e práticas dos portugueses face à corrupção e ao seu controlo. Importa sublinhar que as associações sugeridas pela análise descritiva, entre as percepções, atitudes e experiências autoreportadas de corrupção e os dados de caracterização dos inquiridos, não implicam uma relação inferencial. A título de exemplo, sem uma análise de regressão, não é possível aferir se existem diferenças entre as regiões ou se se trata de efeitos de composição, ou seja, do perfil sociodemográfico das pessoas que lá vivem.

Em linha com o objectivo do estudo de 2006, procuraremos esclarecer os leitores sobr O que pensam os portugueses sobre a corrupção? desbravando a complexidade da dimensão subjectiva do fenómeno e contribuindo, por um lado, para uma discussão informada sobre a importância das normas sociais para a compreensão da tolerância e resiliência da corrupção em democracia e por outro, alertando os decisores para a necessidade de integrar este contributo empírico na reflexão sobre o desenho de políticas e intervenções legislativas e institucionais neste domínio, contribuindo para a sua eficácia