ICS Policy brief 2020 - Obsservatório da Qualidade da Democracia

3 O Governo Português é "o órgão de condução da política geral do país e órgão superior da administração pública" (art. 182, CRP). Constitui, assim, a instân- cia máxima do poder executivo no sistema político e, por essa razão, ocupá-lo constitui a ambição principal da maioria dos políticos profissionais. Como em todas as democracias institucionalizadas, trata-se da arena onde se juntam e convivem o poder simbólico do prestígio social com o poder real das decisões fundamentais. No entanto, e apesar da sua importância, a investigação sistemática do governo é ainda escassa, particularmente quando comparada com outras áreas chave da política democrática como o parlamento, os partidos políticos ou o comportamento eleitoral. Enquanto con- tamos com consolidadas investigações coletivas dedicadas àquelas áreas, fortemente inseridas em iniciativas internacionais, o estudo do governo português, em particular dos ministros, ficou – com uma honrosa excepção 1 - subalternizado. O Projecto SEGov (South European Governments Project) é um projecto de investigação internacional sobre instituições e elites executivas na Europa do Sul, sendo o capítulo português coordenado por Marcelo Camerlo e António Costa Pinto (ICS-ULisboa). Atualmente a equipa nacional é composta por André Paris (Governos e Ministros), Pedro Silveira (Secretários e Subsecretários de Estado), Patrícia Silva (Desenho Organizacional e Pastas), e Teresa Ruel (Governos Regionais). O projeto SEGov tem como objectivo principal a análise comparada das instituições e elites executivas na Europa do Sul ou, mais concretamente, do governo e dos seus membros. Neste Policy Brief apresentamos alguns dados recentemente recolhidos e ana- lisados no âmbito deste projeto para o caso português. Quanto à estrutura, depois de uma secção de enquadramento sobre o lugar do governo no sistema político português, apresentamos uma breve caracterização do actual governo que servirá como ponto de partida para, nas secções seguintes, analisarmos os atributos básicos do governo e das elites governativas em Portugal desde 1976. Assim, serão analisados os principais atributos dos vários governos constitucionais , o seu desenho organizacional , assim como algumas das características mais importantes dos ministros e dos secretários e subsecre- tários de Estado . Por fim, mesmo tratando-se de uma arena com especificidades pró- prias, inclui-se uma secção sobre os governos regionais das regiões autónomas . Siglas utilizadas • PM: Primeiro Ministro • PR: Presidente da República. • AR: Assembleia da República • CRP: Constituição da República Portuguesa 1 Referimo-nos aos trabalhos publicados por António Costa Pinto e Pedro Tavares de Almeida O GOVERNO NO SISTEMA SEMIPRESIDENCIAL PORTUGUÊS Com a aprovação de uma nova Constituição democrática, a 2 de abril de 1976, Portugal adotou um sistema de governo semipresidencial. Ao contrário de outros sistemas semipresi- denciais – em que se verifica uma partilha do poder executi- vo com o chefe de Estado –, em Portugal, o poder executivo constitui uma prerrogativa do Primeiro-Ministro (PM) e do governo. A vontade popular expressa no acto eleitoral é um dos elementos fundamentais no processo de constituição de um novo governo, mesmo que este não seja eleito diretamen- te pelos cidadãos. Após a realização de eleições, o Presidente da República (PR), tendo em conta os resultados eleitorais e depois de ouvir os partidos com representação na Assembleia da República (AR), nomeia um Primeiro-Ministro, geralmen- te o líder do partido que obteve maior número de votos e de assentos parlamentares. Cabe também ao PR a nomeação (mas não a escolha) dos res- tantes membros do governo. A escolha dos ministros e secre- tários de Estado é uma prerrogativa do PM, processo onde o chefe de governo goza geralmente de grande autonomia, tan- to em relação ao PR como aos partidos que servem de suporte parlamentar ao executivo (Lobo, 2005; Almeida e Pinto, 2009). Esta autonomia na selecção dos ministros e secretários de Estado também se verifica no processo de demissão dos mem- bros do governo. Não estando inibido de dar sugestões ou de influenciar, através de mecanismos informais, as opções rela- tivas à composição governativa, ainda assim, são relativamen- te poucos, ao longo dos últimos 45 anos, os casos conhecidos de intervenção presidencial na escolha ou demissão de mem- bros do executivo (Almeida e Pinto, 2009; Franco, 2020). O governo responde politicamente perante a AR, o que sig- nifica que a sobrevivência do executivo depende essencial- mente da confiança e apoio que consegue auferir no seio da instituição parlamentar. Na versão inicial da Constituição de 1976 , porém, o governo respondia politicamente perante o parlamento e o PR. Esta dupla responsabilidade colocava a sobrevivência do governo dependente também da confiança política do chefe de Estado que, à luz do texto constitucional, detinha alguma margem de manobra para demitir o governo, independentemente deste gozar ou não de um apoio maio- ritário no parlamento. A revisão constitucional de 1982 – que subordinou o poder militar ao poder civil e reduziu os poderes presidenciais – suprimiu a responsabilidade política do governo perante o PR e limitou a prerrogativa presiden- cial de demissão do executivo a casos em que “tal se torne necessário para garantir o regular funcionamento das insti- tuições democráticas” (art. 195-2º, CRP). Para além da demissão do governo ou da dissolução da AR por parte do PR, a demissão do executivo pode efectivar-se por via parlamentar. Nestes casos, a queda do governo pode resul- tar da rejeição do programa de governo, da não aprovação de uma moção de confiança ou da aprovação de uma moção de censura por maioria absoluta dos deputados em efectivida- de de funções. Não sendo usual, a demissão do governo tam- bém pode resultar da morte ou da impossibilidade física do primeiro-ministro. Quanto à estrutura, formalmente , o governo é constituído pelo primeiro-ministro, ministros, secretários de Estado e subsecretários de Estado . A Constituição também prevê a possibilidade de existir um ou mais vice-primeiros-ministros. A composição dos executivos tem assentado, porém, num tríptico governativo composto essencialmente por primeiro- -ministro, ministros e secretários de Estado. A existência de vice-primeiros-ministros nos elencos governativos tem estado sobretudo dependente da existência de governos de coligação e, portanto, da necessidade de distinguir hierarquicamente o líder do segundo partido. Quanto à presença de subsecretá- rios e Estado, como será referido adiante, oscilou bastante nos primeiros governos até se tornar uma realidade excepcional. O XXII GOVERNO CONSTITUCIONAL De acordo com o resultado das eleições legislativas, no dia 26 de Outubro de 2019, o Presidente da República indigitou Antó- nio Costa para um segundo mandato como primeiro-minis- tro. Desta vez, ao contrário do sucedido em 2015, o PS foi o partido mais votado e constituiu o grupo parlamentar mais numeroso na AR. Não conseguiu chegar, porém, à tão ambi- cionada maioria absoluta. De qualquer modo, a maioria de esquerda existente na legislatura anterior – e que foi, pela primeira vez na história da democracia, a fonte de apoio e sustentação parlamentar de um governo minoritário do PS – manteve-se no actual quadro parlamentar. Contudo, em vez de uma reedição da “geringonça”, a fórmula política escolhi- da pelo PS para este segundo mandato governativo foi a for- mação de um governo minoritário tradicional. Esta opção voltou a colocar o PS mais próximo daquilo que foi a matriz governativa do partido entre 1976 e 2015. INTRODUÇÃO ÍNDICE Introdução; O Semipresidencialismo. 2-3 O XXII Governo constitucional; Governos 1976-2020. 4-5 Desenho Organizacional do Conselho de Ministros 6-7 Ministros 7-9 Secretários e Subsecretários de Estado 9 Governos Regionais – Açores e Madeira 10

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